O Sol brilha lá fora

Hoje tenho por pano de fundo o verde luminoso dos teus campos simétricos, Mondego. Nestas longas e intermináveis páginas, carregadas de teorias com frequências e intensidades, que vou escrevendo, ganho forças cada vez que olho para ti. As águas que passam, os campos lavrados de fresco e o balançar maroto dos choupos chamam por mim. Prometo que mais tarde saio à rua com o Patolas e vamos caminhar à beira rio. Mas para já fico por aqui mais um pouco a estudar com a companhia do Tumias.

Quando vier a Primavera

Quando vier a Primavera,
Se eu já estiver morto,
As flores florirão da mesma maneira
E as árvores não serão menos verdes que na Primavera passada.
A realidade não precisa de mim.

Sinto uma alegria enorme
Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma

Se soubesse que amanhã morria
E a Primavera era depois de amanhã,
Morreria contente, porque ela era depois de amanhã.
Se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir senão no seu tempo?
Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo;
E gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse.
Por isso, se morrer agora, morro contente,
Porque tudo é real e tudo está certo.

Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem.
Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele.
Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências.
O que for, quando for, é que será o que é.

Alberto Caeiro, in “Poemas Inconjuntos”
Heterónimo de Fernando Pessoa

Dia do Pai

Estar com o nosso pai neste dia é o mais importante. Hoje, uma vez mais, não posso estar com o meu. Mas pelo menos pude ouvir a voz dele, pude perguntar-lhe como foi o dia. É por isso que hoje agradeço.
Neste dia tão especial, a ti, que perdeste o teu pai, desejo a maior força. A maior coragem. Perder alguém não é fácil.
Tu és uma lutadora, cheia de garra e ambição. És uma pessoa bondosa e amável. Mas hoje desmoronaste. Caíste num chão sem fim. Deves estar num sufoco. Sem apetite, com nós na garganta, mergulhada em lágrimas. Chora, amiga, chora. Chora tudo.
Não é fácil.
Quando recebi mensagem com a notícia, não consegui conter as lágrimas. Passaram-me mil e uma coisas na cabeça. As idas à praia no verão, as noites aí em casa, as festas e o bailarico, o baloiço, tantas coisas. O teu pai brincava sempre a dizer que parecíamos irmãs. Tinha um carinho grande por ele. Aquelas piadas que ele contava ao jantar, apanhava-me sempre. Os anos passam mas as pessoas ficam. O teu pai gostava imenso de ti. Gosta. Gostará. Ele vai estar sempre contigo. Sempre a apoiar e a dar força.
Tenho aqui uma flor para te ir levar. Eu queria ir dar-te um abraço, mas não consigo…
Onde quer que ele esteja, estará sempre contigo. Orgulhoso de ti.

Cansaço

O que há em mim é sobretudo cansaço —
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço. 

A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto em alguém,
Essas coisas todas —
Essas e o que falta nelas eternamente —;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.

Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada —
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser…

E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto…
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço,
Íssimno, íssimo, íssimo,
Cansaço…

Álvaro de Campos, in “Poemas”
Heterónimo de Fernando Pessoa

Estou a aprender a ser feliz

Hoje deito-me de coração cheio.
A felicidade não é algo grande, é algo que se constrói aos poucos, com pequenos pedaços. É algo que não tem fim. É o abstrato que tanto teimamos concretizar.
“Sábado à noite não sou tão só” com os amigos de longa data. Os verdadeiros que nos proporcionam incontáveis momentos de pura realização, simplicidade e alegria connosco próprios. Independentemente do sítio, do tempo, da disposição, da circunstância. Faça chuva ou faça sol, caiam serpentinas ou se encontrem cinco euros, quer estejamos a festejar um aniversário ou quer estejamos a dar apoio num momento complicado, somos verdadeiros.
Somos nós.
Os anos passam e as amizades não se esquecem, pelo menos as verdadeiras. Porque essas, apesar de tudo, ficam. Fortalecem-se e aprendem a sobreviver, independentemente do caminho de cada um.
É tão bom estar de novo reunida com aqueles que me acompanharam desde que era minúscula, andava na catequese e usava aparelho. Aqueles que fui vendo crescer e me ajudaram a crescer.
É assim que percebemos que o tempo voa e ainda há tão pouco tempo estávamos na aula de história a contar o número de ‘portantos’ que a professora estagiária dizia em apenas 45 minutos!
Hoje deito-me carregada de boas energias, boas memórias, bons amigos e coração cheio.